O Brasil inteiro vibrou com a prata da skatista Rayssa Leal nas Olimpíadas de Tóquio em 2022. Depois de Rayssa, teve também a prata do Kelvin Hoefler, no street, e de Pedro Barros, no Park. Diante dessas conquistas pioneiras no ano em que o skate estreou nos Jogos Olímpicos, quem aí se lembra que o skate já foi algum dia criminalizado no país?
Em decreto do dia 24 de junho de 1988, o então prefeito de São Paulo, Jânio Quadros, irritado com skatistas que andavam próximo à janela de seu gabinete, proibiu a circulação de skatistas na cidade.
Na década de 80, São Paulo já convivia com o skate há cerca de 20 anos, mas skatista era sinônimo de marginal. O principal ponto de street skate era o Parque do Ibirapuera, só que tinha um probleminha. A Prefeitura de São Paulo funcionava lá, na época. pic.twitter.com/KSu7FVDGl5 — Hugo Fernandes (@hfernandesbio) July 25, 2021
Ele pediu a detenção de "todos aqueles que praticarem esse esporte no leito das ruas e nos logradouros públicos".
Vale destacar que antes de Quadros proibir o skate na capital paulista, ele proibiu a prática primeiro no Parque Ibirapuera, conforme você confere detalhadamente abaixo.
Na época, skatistas eram amplamente discriminados e alvo de preconceitos (não que isso tenha acabado hoje em dia) e o skate estava ainda muito longe de ser considerado esporte (apenas frisando que muitos skatistas consagrados e mesmo amadores, não categorizam o skate como esporte).
Jânio chegou a afirmar em memorando que os "garotos tomariam a lição que o pai não lhes deu”. A proibição durou alguns meses.
A resposta dos skatistas veio politicamente por meio de uma manifestação. No dia 23 de junho do mesmo ano, cerca de 200 skatistas saltaram do metrô Paraíso marchando com faixas e megafone até o Parque do Ibirapuera.
Foto: Reprodução/ Alexandre Tokitaka/ Folhapress
No dia seguinte à manifestação, a prefeitura publicou um decreto ampliando para toda a cidade a proibição que antes era apenas para o Ibirapuera, com previsão de detenção em caso de descumprimento.
Vídeo retirado daqui.
"Eu me sentia um criminoso, porque tinha que me esconder da polícia. Colava adesivo com os dizeres ‘Skate Não É Crime’ nos picos de skate, as delegacias com salas lotadas de skate até o teto. Era cômico, para não dizer trágico,” relembrou o skatista Rui Moleque em uma entrevista para a VICE.
No mesmo ano, Luiza Erundina venceu Jânio nas eleições e se tornou prefeita de São Paulo. E assim, em sua primeira semana de mandato, Erundina revogou a lei que proibia a prática.
Após revogação, a prefeita apareceu em fotos nos jornais da época, sorridente em cima de um skate. "Esta é uma reivindicação natural da juventude, uma disputa de espaço que tem sentido", disse, à época.
Uma pesquisa em 2019 apontou que existem 8,5 milhões de praticantes no Brasil. A essa altura, pós-Olimpíadas, podemos presumir que esse número é ainda maior.
Desde os anos 1960 (que marca a chegada do skate no Brasil) até agora, tem sido um longo caminho percorrido pelos skatistas, com muito sangue, suor e lágrimas.
Felizmente, essas últimas, recentemente, tem sido mais de alegria do que tristeza. E assim torcemos que seja daqui para frente - e que venha as Olimpíadas na França.
* Texto originalmente publicado em www.hardcore.com.br.
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